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Transtorno Explosivo Intermitente: “a síndrome do pavio curto”

Transtorno Explosivo Intermitente: “a síndrome do pavio curto”

 

Carolina Farias da Silva Bernardo – Psicóloga (CRP: 06/98.154)

Especialista em Terapia Cognitiva e Psicologia Jurídica

Sócia-Fundadora do Centro de Terapia Cognitiva Veda

Psicóloga do grupo de Transtorno Explosivo Intermitente do PRO-AMITI do IPq da FMUSP

Certificada pelo Beck Institute em ensino e supervisão em Terapia Cognitivo-Comportamental

 

Para o Dicionário Online de Português a expressão “pavio curto” está relacionada a característica da pessoa que se irrita com facilidade; qualidade de quem se enfurece, se enraivece facilmente ou é irritável.

Em nossa sociedade lemos e ouvimos, em diversos meios, sobre o impacto das emoções de tristeza e de ansiedade na atualidade, mas pouco escutamos sobre a emoção raiva. A raiva é uma emoção humana básica que está relacionada com características neurobiológicas, hormonais, do temperamento e de outros processos fisiológicos. Para Associação Americana de Psicologia a raiva é uma emoção caracterizada pelo antagonismo em relação a alguém ou algo que você sente que deliberadamente lhe fez mal (injustiças, ameaças, frustrações). A raiva pode ser uma coisa boa, pode ser uma maneira de expressar sentimentos negativos, por exemplo, ou motivá-lo a encontrar soluções para problemas. A raiva quando em alta frequência e/ou intensidade, descontextualizada ou desproporcional pode trazer sofrimento significativo e prejuízo em diversas áreas de vida. Um dos principais transtornos que tem a raiva como emoção central é o Transtorno Explosivo Intermitente.

O Transtorno Explosivo Intermitente (TEI) está descrito na sessão dos transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da conduta do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5)1, os transtornos inclusos nesta categoria incluem condições que envolvem problemas de autocontrole de emoções e de comportamentos. Algumas características centrais do TEI são:

  • Falha em controlar impulsos agressivos tendo como consequência explosões comportamentais (agressões físicas, agressões verbais, quebra de objetos ou de propriedade).
  • As explosões comportamentais são desproporcionais ao evento que as desencadeou.
  • Os comportamentos agressivos são impulsivos, ou seja, não são planejados e não têm uma finalidade específica como ter dinheiro, poder e/ou intimidar.
  • As explosões de agressividade recorrentes causam sofrimento acentuado ao indivíduo ou prejuízo no funcionamento profissional ou interpessoal ou estão associadas a consequências financeiras ou legais.
  • Os comportamentos agressivos-impulsivos não podem ser mais bem explicados por outro transtorno mental.
  • Os comportamentos agressivos-impulsivos devem acontecer ao menos duas vezes por semana, em média, por um período mínimo de três meses ou haver três explosões comportamentais que envolvam danos ou destruição de propriedade e/ou agressão física envolvendo lesão corporal contra animais ou outros indivíduos ocorrendo dentro de um período de 12 meses para que ocorra o diagnóstico.

Alguns pensamentos e crenças contribuem para que os portadores de TEI sintam raiva, quando estas ideias são ativadas, e isto associado a um déficit de controle de impulso contribui para que tenham comportamentos agressivos-impulsos (chutar, bater, xingar, humilhar, gritar, quebrar objetos e/ou perseguir no transito). Alguns destes pensamentos e crenças são23:

  • “A agressão é a “melhor opção” de me defender. Quando bato, obtenho respeito”.
  • “Se eu não bato, apanho”.
  • “Se eu não reagir, o outro achará que sou trouxa”.
  • “Se eu explodo, então sou ouvido”.
  • “As injustiças precisam ser combatidas”.
  • “Não sou valorizado”.
  • “O mundo é injusto”.
  • “As pessoas querem tirar vantagem”.
  • “As pessoas me desafiam”.
  • “Injustiças são inadmissíveis”.
  • “As coisas precisam ser corretas”.
  • “As pessoas devem seguir sempre as regras”.
  • “Sou feito de idiota, não sou respeitado”.
  • “Não sou ouvido em minha opinião, não tenho valor”

A Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) é indicada para o tratamento do TEI4 e há um suporte empírico para intervenções de TCC para redução da raiva567. A raiva é conceituada dentro de uma ampla estrutura cognitivo-comportamental8, enfatizando: eventos desencadeantes;  o estado de pré-raiva da pessoa,  condições temporárias; processos cognitivos, familiares ou culturais mais duradouros; a experiência e a resposta da raiva (componentes cognitivos, emocionais e fisiológicos); componentes comportamentais relacionados à raiva e resultados e consequências relacionados à raiva. O tratamento envolve reestruturação cognitiva (flexibilidade de pensamentos e crenças disfuncionais), estratégias para regulação emocional e regulação da excitação fisiológica, treino de habilidades para a expressão adequada da raiva e estratégias para controle do impulso2. Além disto, em muitos casos, é indicado o tratamento medicamentoso9, pois a disfunção do sistema serotonérgico central (5-HT) está relacionada ao comportamento agressivo impulsivo.

 

Referências Bibliográficas:

  1. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders (DSM- 5), Washington, DC. 2013.
  2. Seger, L, Bernardo, C. F. S., & Morillo, J. (2017). Características do transtorno explosivo intermitente e seu manejo na clínica psicológica. In Federação Brasileira de Terapias Cognitivas, C. B. Neufeld, E. M. O Falcone, & B. P. Rangé, (Orgs.), PROCOGNITIVA - Programa de Atualização em Terapia Cognitivo-Comportamental: Ciclo 4. (v. 2, pp. 1 15-151). Porto Alegre: Artmed Panamericana. (Sistema de Educação Continuada a Distância).
  3. Seger, L, Bernardo, C. F. S., Morillo, J. e Geraldo, D.E. Como lidar com a raiva e o transtorno explosivo intermitente: guia prático para pacientes, familiares e profissionais de saúde. 1.ed. – São Paulo: Hogrefe, 2020.
  4. McCloskey MS, et al. "Cognitive-Behavioral Therapy for Intermittent Explosive Disorder: A Pilot Randomized Clinical Trial," Journal of Consulting and Clinical Psychology (October 2008): Vol. 76, No. 5, pp. 876–86.
  5. Deffenbacher, J. L. (2006). Evidence of effective treatment of angerrelated disorders. In E. L. Feindler (Ed.), Anger-related disorders: A practitioner's guide to comparative treatments (pp. 43–69). New York: Springer.
  6. Del Vecchio, T., & O'Leary, K. D. (2004). Effectiveness of anger treatments for specific anger problems: A meta-analytic review. Clinical Psychology Review, 24, 15–34
  7. DiGiuseppe, R., & Tafrate, R. C. (2003). Anger treatment for adults: A meta-analytic review. Clinical Psychology: Science and Practice, 10, 70–84.
  8. Deffenbacher, J. L. Cognitive-Behavioral Conceptualization and Treatment of Anger. Cognitive and Behavioral Practice 18 (2011) 212-221.
  9. Coccaro, E.F.; Lee, R.J. e Kavoussi, R.J. A double-blind, randomized, placebo-controlled trial of fluoxetine in patients with intermittent explosive disorder. J Clin Psychiatry. 2009 Apr 21;70(5):653-62. Doi: 10.4088/JCP.08m04150.

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